quinta-feira, 30 de setembro de 2010

SALINEIROS DE CORAÇÃO (iii) - IMPACTO TURÍSTICO









O turismo favorece a criação de áreas, programas e entidades (governamentais e não governamentais) de protecção da fauna e flora e de conservação de sítios arqueológicos e monumentos históricos (Ruschmann, 2002), infelizmente, no nosso caso, acontece exactamente o contrário – como exemplo, as salinas de Pedra de Lume, o maior monumento histórico do país encontra-se em estado de degradação extrema transformando aquela localidade num vilarejo fantasmagórico.

Na minha última reflexão abordei a questão da necessidade de um estudo sobre a satisfação para analisar até que ponto o turismo pode ser um instrumento de desenvolvimento e valorização da pessoa humana, e como a hotelaria impacta a comunidade local. O que acontece no nosso meio, salvo raras excepções, os estudos encomendados nascem com o intuito de reforçar o ponto de vista de quem os encomenda e não de retratar a realidade tal como ela é.

Como pistas para reflexões posteriores, gostaria de cruzar alguns pressupostos do desenvolvimento turístico com alguns dados sociológicos relativos ao impacto do turismo em Santa Maria, segundo alguns depoimentos dos locais:

• Se por um lado há um sentimento de orgulho pelos recursos naturais turísticos da ilha por outro há uma desilusão pela forma como os próprios cidadãos se sentem privados da livre circulação pelos espaços turísticos à sua volta. (Besculides e colaboradores, 2002).

• A priori, o turismo deveria permitir que moradores e turistas inter-relacionassem – o que possibilitaria a aquisição não formal de conhecimentos e também para o desenvolvimento de tolerância mas, infelizmente, o modelo adoptado de «tudo incluído» afasta uns e outros numa clara desvantagem para os locais.

• O turismo favorece a criação de áreas, programas e entidades (governamentais e não governamentais) de protecção da fauna e flora e de conservação de sítios arqueológicos e monumentos históricos (Ruschmann, 2002), infelizmente, no nosso caso, acontece exactamente o contrário – como exemplo, as salinas de Pedra de Lume, o maior monumento histórico do país encontra-se em estado de degradação extrema transformando aquela localidade num vilarejo fantasmagórico.

• O turismo deveria contribuir para a melhoria das condições de acesso, instalação ou expansão de canalização de água, esgoto, energia eléctrica e outros serviços públicos (Aulicino, 2001); contrariamente a este pressuposto, temos uma cidade mal iluminada e o resto todos já sabem.

• O turismo contribui para a geração de renda, criação de empregos e aumento na arrecadação de impostos (Aulicino, 2001; Ruschmann, 2002; Burns, 2002). - Do ponto de vista do cidadão comum estas vantagens acabam por criar um sentimento de frustração e um pessimismo galopante visto que na prática essas receitas acabam nas mãos de uma minoria restrita e o emprego precário é desmotivante.

Para complicar ainda mais a vida, o cidadão comum, aquele que corre atrás do seu sustento no dia-a-dia, tem que lidar com (1) a especulação imobiliária que inflaciona o preço dos terrenos e leva à descaracterização do ambiente e à deslocalização dos moradores tradicionais do lugar – que são, em geral, confinados a locais mais pobres e distantes (Calvente, 2001); (2) mão-de-obra desqualificada como trabalhadores de construção civil, trabalhadores da restauração vindos de outras paragens desestruturando a economia de subsistência dos locais; (3) por razões económicas, trabalhadores vindos de outras ilhas e da costa africana acotovelam-se em quartos superlotados; (4) a insuficiência de moradias, de escolas, centros de saúde e acções culturais; (5) o aumento do preço das mercadorias, do barulho, problemas de saneamento básico, alteração nos estilos de vida e costumes.

PRINCIPAIS MONUMENTOS DE INTERESSE NO SAL:

1. SALINAS DE PEDRA DE LUME: o maior e mais importante património natural do país pela sua beleza e exuberância.

Estado de conservação: carece de uma intervenção urgente para preservação do que ainda existe antes que seja tarde demais.

2. FAROL DE FIÚRA: hoje, um gigante de pedra em ruína que a qualquer momento sucumbirá restando apenas pedra sobre pedra, contudo, à semelhança do que acontece em outras paragens, ainda vamos a tempo de reerguê-lo.

3. PONTÃO DE SANTA MARIA: ex libris da cidade, o cartão postal do país turístico.

Estado de conservação: muito boa mas completamente desfasado do que era o pontão original; reabilitar sim mas não delapidar o testemunho do passado.

4. RESIDÊNCIA DE MANUEL ANTÓNIO MARTINS: localizada em Santa Maria e, por se tratar do fundador da ilha, pela sua localização e dimensão, tem todas as condições para ser o museu da história da ilha).

Estado de conservação: decadente.

CONCLUSÃO

A Ilha do Sal deveria ter um estatuto especial, tendo em conta as suas especificidades no panorama nacional. Deste estatuto defendemos que (1) 49% das receitas do turismo deveria ser dirigida a acções que beneficiam directamente a população local e (2) todos os programas de investimento deveriam contemplar uma acção que reflectisse a Responsabilidade Social.

Lembremos que o sol, as praias e toda a riqueza natural desta ilha que são vendidos aos turistas pertencem este povo – os salineiros de coração.

Evel Rocha

Ildo0836@gmail.com

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